15 de novembro de 2009

. sei lá .

. sei lá . não sei . tanto faz . tem dias que é assim . essa coisa toda . esse vácuo no meio do corpo . ... . e nem é fome que eu sei . é um vazio de mundo . uma preguiça de vida . uma vontade de canto . de quina . de silêncio bem mudo . de nada . de tudo . sem meio termo por hoje . ... . é que ultimamente não tenho dado muito palavras às coisas que ando sentindo . tento traçar em linhas curvas que não são letras . mas desenhos abstratos . imagens concretas do que a gente não sabe dizer . tenho deixado adormecidas as palavras que saem pelos dedos . tenho deixado a boca seca . o ouvido mudo . os olhos cegos . o corpo curvado . deve ser o peso de tanta palavra dentro... . fora . acho que cansei... . acho que é sono . acho . preciso achar uma maneira de pesar mais nas coisas que faço . sei lá . não sei . tanto faz . é que tem dias que é assim .

12 de novembro de 2009

. e uma asa na alma .

... é . é que eu prefiro as coisas que não terminam . as coisas que vão além das bordas . dos desenhos que vão e dão continuidade saindo do papel e terminando onde permite a imaginação . eu prefiro as coisas largas . que não se pode segurar com as mãos . prefiro as coisas que não cabem nos olhos . e que não cabem aos olhos uma ilusória distinção . eu gosto das palavras inventadas . de idiomas intraduzíveis . de sotaques misturados . eu gosto de bagunça no quarto . pra arrumar as coisas arrumando a vida . eu gosto da estranheza . do inesperado . do que balança o que parece tão bem estabelecido . eu gosto da estranheza do silêncio . e gosto quando esse silêncio aproxima . eu gosto muito de silêncio . muito mesmo . e de cidades pequenas . de cidades estranhas . de pessoas que se conhecem e que se falam nas ruas sem educação . gosto de intimidade porque intimidades não pede que você seja educado . educação é formalidade . e eu não gosto de coisas formais . não gosto de programas burgueses . de bairros de elite . não gosto de roupas caras . não gosto de maquiagem . nem de salto alto... . mas me pergunto às vezes se isso faz realmente grande diferença... . não interessa qual a fantasia que se usa no dia-a-dia . qualquer roupa é qualquer fantasia . e as fantasias não te dizem realmente sobre a nudez do corpo . usar roupas é questão de educação . de civilização . e eu não sei se vejo muita vantagem em ser tão bem civilizado . pessoas civilizadas em suas organizações não sorriem muito . são todas tensas preocupadas em atuar muito bem o papel que aparentam ter com suas fantasias . é tudo muito atuado demais . pouca espontaneidade . pouca alegria . pouca paz . pouco caos . por isso que cidade grande parece estar sempre a ponto de bala . elas se encontram sempre no meio termo de um fio tênue entre uma coisa e outra . isso às vezes parece interessante quando se trata de uma cidade onde tem pessoas do mundo inteiro se fantasiando de todas as maneiras possíveis . a qualquer momento um bum . e pessoas começando a entender o que se trata realmente de espontaneidade . de ter o corpo em movimento... . cidades organizadas são recheadas de tédio . pessoas sendo educadas o suficiente para serem o mais mecânicas possíveis . e as coisas mecânicas me deixam realmente entediada . me deixa com sono . com preguiça de viver . sei lá . ando escrevendo bem menos . tem uma coisa adormecida aqui dentro . parece que ainda é aquela história de lagartas guardadas em casulos com medo de virar borboleta... . sei lá . tanto faz . só sei que gosto de coisas que dão asas à imagem . asas à iaginação . pra que se tenha uma asa na alma . pra que se queira sempre continuar coisas que parecem não terminar . em nada . nem em si . nem no outro . coisas que ão tocam você porque passam por você sem que você tenha dentro . um corpo sem limites . um mundo sem limites . sem fronteiras . sem órgãos . pra que a asa voe . pra que tudo tenha ilimitado movimento . pra que tudo o que se sinta não se esbarre com uma questão de entendimento . é que a vida não tem discernimento . é que...

9 de novembro de 2009

. o galho da alma .

. vim . ver . voar . pousar em outra janela . aprender um novo pouso . preparar os ombros pra cair num novo abismo . de asas abertas . de olhos fechados . de pés desatados . desacorrentados . ir . vir . voltar . nunca pro lugar de partida . a partida é sempre um novo lugar de chegada . pisar em terreno novo: "aqui, estou eu . sentada ao lado de um felino com as portas, da janela, abertas . pupila dilatada . a cor da noite . o barulho de chuva . e o pulo do gato num novo movimento ... a paisagem da minha janela tem linhas retas . céu fechado e pequeno . os dias sem raio de sol . mesmo em dia ensolarado . observo a vida . nas outras janelas . nessa hora do dia a vida dorme e sonha em quartos escuros . uma ou outra janela aberta pro mundo . a vida não vive a madrugada . ao lado do muro esquerdo uma árvore . pelo menos uma . e continuo sentada pensando que o que a natureza cria é cheio de curvas . pra dar movimento..." . o que o homem cria é quase sempre reto . homens constroem paredes . muros . janelas e portas retas em seus sentidos . o homem cria barreiras . mapeam seus espaços . ilusões sem propriedades que ainda se insistem como definições humanas . a janela do meu quarto está reta na nova cidade desconhecida . e eu, nela, fechada com minhas portas entreabertas . pés inseguros na ilusão de suas prisões . rir . ser . olhar . quebrar a linha reta desse horizonte sem horizonte . se confundir . ir . se perder . em si . ter . saudade . pousar . ser o lugar . sucessivas imagens .

6 de novembro de 2009

. desenho sanguíneo .

. é que desenhar é como viver o que se vive . o que se pensa e o que se sente independente do que seja . é que traçar um traço numa folha de papel é como dar borda ao que não se decifra . não se pega nas mãos... então a mão vai lá e faz . se inscreve como uma imagem aquilo que vê entrando pelo olho da pupila . não é uma questão de captura . nem de decifrar o que se olha . não é uma questão de dar um nome à coisa vivida . ilustrar e engavetar a vida . não há como tocar na vida . a vida não é algo dado como uma pedra ou qualquer outra coisa . a vida vigia às coisas do mundo como um felino silencioso observa o movimento da rua . sentado na borda da janela . no topo de um telhado . dentro do seu escuro . dentro de seu silêncio . desenhar é dar adeus . dar adeus às histórias . despedir-se de si mesmo . corrente sanguínea entre a tinta e o corpo . é o corpo se jorrando como quem se respira . é ir e vir sem sair do lugar . pra que se chegue em todos os lugares .